quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Sharon Olds, paixão da hora.

I Go Back to May 1937*

I see them standing at the formal gates of their colleges,
I see my father strolling out
under the ochre sandstone arch, the
red tiles glinting like bent
plates of blood behind his head,
I see my mother with a few light books at her hipstanding at the pillar made of tiny bricks,
the wrought-iron gate still open behind her, its
sword-tips aglow in the May air,
they are about to graduate, they are about to get married,
they are kids, they are dumb, all they know is they are
innocent, they would never hurt anybody.
I want to go up to them and say Stop,
don’t do it—she’s the wrong woman,
he’s the wrong man, you are going to do things
you cannot imagine you would ever do,
you are going to do bad things to children,
you are going to suffer in ways you have not heard of,
you are going to want to die. I want to go
up to them there in the late May sunlight and say it,
her hungry pretty face turning to me,
her pitiful beautiful untouched body,
his arrogant handsome face turning to me,
his pitiful beautiful untouched body,
but I don’t do it. I want to live. I
take them up like the male and female
paper dolls and bang them together
at the hips, like chips of flint, as if to
strike sparks from them, I say
Do what you are going to do, and I will tell about it.

* I go back...

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

choque de realidade II*

“As pessoas reagiam com um ódio que eu não conseguia entender de onde vinha. Fui xingada como se tivesse cometido um crime. De andar na calçada e as pessoas gritarem de dentro do carro: ‘Vagabunda!’. Em restaurantes, sempre aparecia gente zoando. E você lá, comendo com o seu namorado, conversando de coisas simples, como o gato que está com a pata machucada, tinha que levantar e ir comer em outro lugar.”

Mallu Magalhães, sobre as dificuldades do comecinho do namoro com o músico Marcelo Camelo.

* Dei a dica pro Marquinhos, da Contracapa, e agora publico aqui também. Assustador demais.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

choque de realidade

Senhoras e senhoras, bem-vindos ao século XXI:

:: O general Raymundo Nonato de Cerqueira Filho defendeu, esta semana, que as Forças Armadas só devem aceitar homossexuais que mantenham segredo de sua orientação sexual. Para o digníssimo senhor, constrangedoramente ignorante em relação à constituição brasileira, há incompatibilidade entre os gays e a atividade militar. Adepto de ferrenho positivismo, ainda tentou explicar: "A vida militar reveste-se de determinadas características, inclusive em combate, que pode não se ajustar ao comportamento desse indivíduo".

:: Tessália, do BBB, deixa a casa sob ataques ferrenhos da COMUNIDADE por ter explorado o edredon ao lado do namoradinho, Michel, que omitiu detalhes do seu estado civil. Já "acusaram" a moça de lesbianismo, vagabundagem, sem-vergonhice, dentre outras ofertas. Enquanto isso, a oficial faz ensaio "sexy" no site Paparazzo, famoso reduto de sub-celebrities, e revela detalhes "estarrecedores e picantes" do relacionamento. A réplica da Twitess é a melhor parte do enredo: "Tô pouco me lixando". Salve, salve.

Eu tenho vergonha de viver nesse mundo.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

1ª pessoa, masculino

Senti apenas tédio quando cheguei à Inglaterra. Amava Lívia, e já não era mais possível refutar a óbvia assertiva. Amava-a para além dos raros encontros nus, amava-a para além da perfeição dos traços e das evasivas, amava-a para além da ficção radiosa que carregava de um canto a outro como um tesouro ofertado a raros merecedores. A ficção era o seu produto mais bem acabado, denso e refinado, e desejá-la fora daquele espaço exigia uma intensidade que eu não imaginava dispor. Uma intensidade que começou a despontar no exato instante que observei suas pernas compridas e seus olhos puxados invadindo a sala de reuniões pela primeira vez. Era o ano de estréia da minha faculdade.

Para meu desespero, todos repararam a sua presença, e lutaram para adivinhar as disciplinas reivindicadas, e devoraram o olhar azul e oblíquo, e imaginaram suas costas ao sol e seus braços finos despidos de mangas e babados - "seria ainda mais bonita nua?" Alheia às especulações, ela atravessou o salão sem se intimidar com as expressões atabalhoadas ou os ruídos do próprio salto, sempre no mesmo passo decidido, suave mas compassado, num ritmo exclusivo dela. Olhava para a frente, presa num ponto fixo, absorvida por certo universo interno que, já ali, parecia envolvente como um bom livro. Apresentava uma segurança gratuita, em tom de desafio, como se já tivesse enfrentado um escândalo imprevisto e terrível.

Antes mesmo que ela se acomodasse, meus pensamentos já tinham arrancado o seu vestido cor-de-rosa, beijado com força seus lábios escurecidos pelo batom e possuído cada pedaço da sua alma com tranqüilidade e força. Quando acendi o primeiro cigarro, depois de fazê-la gozar três vezes, a versão vestida de Lívia escolhia um lugar ao meu lado, numa das tantas cadeiras vagas, ainda cheirando a tinta fresca. Sentou, bufou, espalhou os pertences sobre o apoio estreito. Na seqüência, virou-se para mim e abriu um sorriso brilhante, o único daquela tarde. Foi como receber um convite para a mais secreta fraternidade.

Retribui, forçando frieza, e protelando qualquer entrega ao deslumbramento. Cochichei em seu ouvido, disposto a recusar o atordôo pelo singelo sorriso de abertura: "Estão combinando o horário das reuniões mensais com a diretoria". Ela rebateu: "Como serão aos sábados, nem me interessa". E riu, sozinha. Se desconfiasse que eu era o diretor, a ironia seria bem maior, sem dúvida.

Hoje eu sei como Lívia funciona.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Sempre ele.

And in her eyes you see nothing,
No sign of love behind the tears cried for no one,
A love that should have lasted years.
(The Beatles)

Um ricaço de West Egg promove festas nababescas em sua mansão. Com uma taça de champanhe legítima na mão, desprezada sempre antes do fim, observa o combinado de grunhidos, perfumes e afetações do alto da varanda. Nunca conseguiu se divertir. Todas as notas de jazz tentam reparar uma perda inesquecível, a perda de Dayse, sua namorada de adolescência. Há anos espera a madrugada do reencontro, quando ela, finalmente, borboleteará toda a sua futilidade pelos jardins bem cuidados da residência. Ela nunca chega; talvez nunca tenha havido amor no seu olhar. Por Dayse, Jay Gatsby virou milionário, desafiou leis, comprou brigas infindáveis, chorou lágrimas secas, atraiu toda a maledicência da província. Ela nunca se importou; a aparência borbulhante do seu castelo de cartas sempre pareceu mais viçosa. Ele compreende a impossibilidade: "Às vezes a gente perde o principal, meu velho". Às vezes não, Gatsby.

Baita história - forte, doce e triste, como a vida. Sem dúvida, o mais bem escrito romance de Scott Fitzgerald, embora não seja o meu xodó (http://jadices.blogspot.com/2009/10/meus-mais.html). É a sexta vez que leio e sempre fico impressionada. Como disse o MESTRE Paulo Francis, "se você algum dia foi jovem e se apaixonou, Fitzgerald escreveu este livro... só para você".

É isso aí, meu velho.