domingo, 10 de maio de 2009

Passarinhos ao vento

Nunca gostei de Elizabeth Taylor. Não acho boa atriz, sequer bonita. Tem um pescoço curto que me irrita e coleciona trejeitos de intérprete amadora. Fora aqueles olhões em tom de violeta, realmente raros e estonteantes, nada mais me agrada ali. Ontem, porém, venci minha resistência ao assistir uma versão piratona de Sandpiper, ou Adeus às ilusões, como preferiu a tradução brasileira, sempre tão competente em escancarar as sutilezas já na chamada.

A sugestão partiu do pai, e como foi ele quem me criou esteticamente em tão variados sentidos, me entreguei à experiência despida de qualquer preconceito. Qualquer mesmo, inclusive os que sempre dirigi à mocinha modernosa da trama. Liz Taylor é Laura Reynolds, uma pintora um tanto libertina, mãe solteira e namoradeira, que vive numa casa belíssima numa pequena cidade do litoral da Califórnia. Seu menino, Danny, é considerado um tanto selvagem para os padrões locais.

Após matar um veadinho, para entender por que o homem é o único animal que mata por prazer, lição da mãe, Danny é obrigado pelo juiz do vilarejo a ingressar numa escola episcopal cheia de regras. Ele se apaixona pelo ambiente, repleto de meninos da sua idade. Laura, claro, se apaixona pelo pastor da escola, o correto pai de família Edward Hewitt, interpretado por Richard Burton, futura encrenca da vida de Liz Taylor. É correspondida, para desespero de ambos.

Moderno por arrancar os preconceitos da difícil história de amor nascida do casal extraordinário, fora dos padrões, o filme, de 1965, disseca as impossibilidades surgidas quando encontramos certo hiato. O hiato melancólico vivido quando estamos no momento exato com a pessoa errada, ou com a pessoa exata no momento errado. Muitos filmes já tocaram no assunto, mas poucos conseguem atingir o ponto mais profundo. Alguns retornos são impossíveis, alguns princípios nos foram passados sob véus de ingenuidade e maldade, algumas histórias são belas justamente porque compõem as entrelinhas da vida, aquilo que jamais se tornará texto, lauda, cena.

Sandpiper aborda o fora da cena. O proibido mas não menos ético. O triste mas igualmente potente, forte. O legítimo, embora deslocado. Estão ali, na tela, os instantes de erro, mais do que os acertos; as confusões emocionais, mais do que as clarezas; os amores dúbios, mais do que as garantias. Tudo pode dar errado, a qualquer momento. Mas tudo pode dar certo também. Não basta acreditar, afinal o povo dali despreza a auto-ajuda de best sellers como O Segredo. Basta viver. E isso Laura Reynolds, embora apressada e trapalhona, sabe fazer como ninguém.

Filmaço, que ainda traz Charles Bronson num papel coadjuvante.

3 comentários:

  1. Concordo contigo, Jade.AMEI o filme e o Big Sur como cenário. E aquela casa é mesmo de fazer a gente babar. Mas a Liz era muito linda, guria. Não as belezas perfeitas que a gente encontra hoje, conseguidas à custa de plásticas, mas uma beleza natural,com alguns defeitos ...
    bj

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  2. Bravo! Clap, clap, clap.

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  3. Pô, ela era lindona e deu um banho em "Who's Afraid of Virginia Woolf?".

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